Há coincidências de datas que dificilmente escapam à análise e à reflexão. Não deixa de ser curioso que o último Presidente da Câmara Municipal da Murtosa nomeado ainda pelo Estado Novo toma posse a 24 de Abril de 1974. A Revolução dos Cravos encontra Aurélio do Patrocínio Nunes recém-chegado às funções oficiais que assegurará até à transição de poderes efetivada apenas em fins de outubro desse mesmo ano. Impelido pelo dever de serviço público e apesar das movimentações militares e das várias manifestações que o país experienciou por ocasião do 1º de Maio, Aurélio Nunes manter-se-á em funções durante os primeiros meses vividos em liberdade, por entender que a boa gestão da Murtosa e o assegurar dos interesses concelhios estavam em primeiro lugar.

As suas palavras na reunião de 2 de maio de 1974 são elucidativas: “Com o histórico Momento das Forças Armadas, que se está a processar, ninguém sabe as transformações por que terão de passar as Câmara Municipais mas, sejam elas quais forem, outro rumo não tomará que não seja o de colaborar com tudo o que seja para o bem comum e engrandecimento da Murtosa”.

Aliás, em reunião de 16 de maio, reconhecendo o golpe militar e regozijando-se com a atuação do Movimento das Forças Armadas renovará esse firme propósito, sem prejuízo de entender colocar o seu lugar à disposição daquele Movimento. A documentação oficial deste período mostra-nos uma estranha continuidade, até mesmo a nível formal, como se um tão estruturante acontecimento não se tivesse passado.